Volta e meia lá tenho de ir às compras, dito assim
parece que sou um daqueles tipos hiper organizados, quando bem na verdade sou
como todos, vou lá várias vezes por semana, porque falta e ou me esqueço sempre
de qualquer coisa, no passado sábado lá fui então, armado da mais seráfica das
paciências, porque ir às compras a um hipermercado já é uma experiência
dolorosa, nestes tempos de “pré-Natal” começa a ser um drama, pois por estas
alturas as pessoas parecem ficar possuídas, não por um benevolente e cordato
espírito natalício, mas antes, por um espírito demoníaco de estupidez e
imbecilidade, que os transforma em ogres ainda mais labregos, mal educados e
patéticos que o normal do dia a dia do resto do ano.
Empurrando o carrinho, que aparco cuidadosamente num
local que não cause embaraço a quem passa, cuidado que ajuda imenso à
circulação e demonstra algum respeito pelos outros, palavra que a maioria dos
ogres frequentadores daquele tipo de espaços não faz a mais pálida ideia do que
seja, peguei num daqueles infernais sacos de plástico, e lá fui, tirei a lista
do bolso, cuidadosamente escrita na letrinha bonita e redondinha da esposa que
fui consultando para não falhar nada, umas bananas, depois umas peras, umas
maças para lanchar a meio da manhã, uma alface, mais uma couvita, uns
tomates...
Enquanto eu andava nestas deambulações ali junto aos
expositores das frutas, legumes e tubérculos, do outro lado da bancada, uma
criatura, não saía do mesmo sítio onde estava especado, de onde eu estava não
conseguia o que o sujeito estava a fazer, apenas que remexia em algo, demorei
uns bons 10 ou 15 minutos talvez a tratar da lista da fruta e dos verdes, e o
homem continuava ali pegado naquela ponta da bancada.
Abastecido de frutas e legumes, roído até ao tutano pela
curiosidade, peguei no carrinho e dei a volta para tentar perceber o que é que
aquela criatura estava a fazer ali há tanto tempo, dado que já ali estava
quando eu cheguei, calmamente fui andando, disfarçando, passando mesmo ao seu
lado.
Assim que passei por ele percebi aquela tão longa
demora, a criatura, munida de um saco, estava a escolher castanhas. Escolhia
uma a uma, pelas maiores claro está, nada de pegar no utensílio que lá se
encontra ao dispor para enchermos os sacos, nada disso, essa criatura, dotada
de um superior espírito de sacrifício inaudito, predispôs-se a escolher uma por
uma as castanhas presentes naquele monte, certificando-se que só iria, pesar,
pagar e mais tarde rilhar no conforto do seu lar as melhores castanhas que o
seu dinheiro pode comprar, os outros, a outra corja, a outra ralé pateta que
fique com a castanha bichenta, enfezada ou bolorenta, que ele trata de
assegurar que só trinca o melhor, louve-se a paciência, ainda há gente que é
dona do seu tempo e o tem para desperdiçar em mesquinhices.
Mal comparado este cavalheiro enquadra-se numa classe
de frequentadores de hipermercados que são os “apalpadores”, não temam as
senhoras, nem as acesas feministas afiem os facalhões castradores para se
lançarem numa cruzada contra os “apalpadores” dos hipermercados, porque estes
de que falo não apalpam mulheres, nem homens o que sei, o prazer erótico, que
este tipo de “apalpadores” que descrevo, têm advém do apalpar de frutas.
Os “apalpadores” são tanto homens como mulheres, por
norma podemos observa-los junto aos expositores da fruta, ferrando a unhaca
suja, nas frutas, apalpando um por um os pêssegos carecas ou as uvas sem
grainha, rebolando nos dedos e acariciando com desvelo a banana ou o morango,
vendo-se nos seus esgares o prazer sexual que retiram de tal actividade,
acredito que devam ter sonhos húmidos com montes de pêras, de kiwis ou de
ameixa branca do Quénia para apalpar, imagino-os a arfar depois de orgasmos
múltiplos obtidos ao devassar a consistência da papaia dou da manga do Brasil,
naquilo que é um excelente exemplo de porcalhice colectiva.
No que aos “apalpadores” concerne já vi de tudo, a
insuspeita velhinha que vai ferrando a unhaca nas maçãs, a matrona que
esborracha os pêssegos ou mesmo o sujeito careca com ar de pateta que
esborracha as extremidades do melão, que o cheira e que lhe espeta os dedos, um
verdadeiro “expert” em matéria de “apalpação” fruteira, com ar de compenetrado
de entidade suprema da a palpação meloal.
Como vêem caras e caros leitores, a ida a um
hipermercado, essa deslocação aparentemente sensaborona, muitas vezes obnóxia e
irritante, pode ser divertida se nos entretivermos a observas as taras e as
manias da fauna que deambula por ali, como aquela criatura que naquele sábado
invernoso que fui às compras dedicava meia hora da sua vida a escolher
castanhas.
Um abraço, deste vosso amigo
Barão da Tróia
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