“Em
Abril sentado no meu alpendre vejo a parada passar,
Vejo
os meus velhos camaradas orgulhosamente a marchar.
Recordando
antigas glórias, todos dobrados e doridos,
Heróis
de guerras esquecidas, heróis esquecidos.
E
os mais jovens perguntam “Porque estão eles a marchar?”
Pergunto-me
o mesmo enquanto a banda está a tocar,
Enquanto
eles passam a marchar,
Ano
após ano menos aparecem para desfilar,
Temo
que um destes dias, ninguém mais irá marchar.”
Tradução livre de um excerto da canção
"And The Band Played Waltzing Matilda" dos Pogues ”
Há duas semanas faleceu um amigo, um velho
combatente, também ele marchava orgulhosamente no 10 de Junho, agora que
felizmente resolveram dar algum relevo e mostrar respeito pelos antigos
combatentes, apesar de eu acreditar que o relevo deveria ser dado a todos os
veteranos, ou seja a todos os que cumpriram serviço militar em prol desta coisa
Pátria, sem prejuízo de mostrarmos o nosso respeito pelos que foram combater,
muitas vezes por quimeras patéticas.
Esse meu amigo, foi um dos meus instrutores há trinta
anos quando “assentei praça” como se dizia antigamente. Trazia no seu
curriculum várias comissões na Guerra Colonial, nos ombros as divisas de
sargento. Partiu esse bom amigo, com ele parte mais uma parte de mim, parte uma
migalha do fim do Império.
Eu sou um desses filhos dos restos do Império, cresci
com histórias de guerra, na escola o meu núcleo duro de amigos tinha um
angolano branco, um moçambicano preto e um indiano, nunca ninguém se lhes
referia pela cor, mas pelo nome, não eram afro não sei quê ou luso coiso e tal,
eram portugueses, eram o João, o Carlos e o Henrique, também eles filhos dos
restos desse Império que desapareceria definitivamente em 1999 com a entrega do
território do Leal Senado à China.
O Império velho de 500 anos, teve apenas uma década
de fulgor, a década de 50 do século XX, no fim dessa década, poucos perceberam
que o kurikutela da História galgava barrancos inexorável no seu percurso
anunciando que o ouro negro traria novas de um acordo final que acabasse em paz
e assim foi, mas foi preciso muita guerra, muita morte, muito sangue, muitas
lágrimas e muita dor e o Império findava sem glória.
Muitos gostam de ver os antigos combatentes como
exemplos do brio perdido desse sonho imperial, não digo que não haja no meio
desses milhares de homens e de mulheres, gente que assim pense, tenho porém que
a grande maioria sente-se orgulhoso apenas por ter sobrevivido e por ter feito
aquilo que deles se exigia, apesar de depois de 1974 terem sido completamente
esquecidos pelo mesmo Estado que os mandou para uma guerra estúpida.
Este meu excelente amigo, já octogenário, dizia
sempre que fez o que tinha que fazer pois era militar, não odiava nada nem
ninguém, tinha saudades dos camaradas, tinha saudade de ser jovem, de resto não
tinha saudades de mais nada, faleceu paz à sua alma, honre-se a sua memória e a
todos os que combateram, respeitem-se essas mulheres e homens pela coragem, são
os restos do Império que mais uma ou duas décadas serão apenas memórias
inscritas em monumentos e manuais de História, fica aqui expressa a minha
homenagem.
Um abraço, deste vosso amigo
Barão da Tróia
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