Portugal
está cada vez mais surreal, mais anedótico, mais patético, não seremos porém
caso único, o Mundo parece estar à deriva, digo-o sem querer de todo parecer um
alarmista, fatalista ou outro qualquer desses “istas” com que costumam rotular
a malta que diz ou pensa alguma coisa contra ou diferente da corrente
estabelecida como própria e oficial para a navegação da carneirada.
No
entanto, os pequenos casos sucedem-se, coisas verdadeiramente anedóticas, “fait
divers” dirá a turba esclarecida, concedo que sim, respondo com outro chavão “o
Diabo são os pormenores”, quem gosta de Poirot, Sherlock ou Marple sabre que
são sempre os detalhes mais mesquinhos, insignificantes na sua aparência que
tramam os bandidos, dito isto passo a descrever a cena, que se passou comigo.
Uma
pessoa minha amiga, sem que se lhe conheçam ancestrais raízes africanas
próximas, tem o cabelo crespo e o tom de pele muito moreno, que nesta altura de
férias fica mais acentuado por causa dos dias de praia, até aí tudo normal, nós
somos um povo de miscigenação, ao contrário do que pensa essa gentalha racista,
foi toda essa continuada mistura, que fez de nós aquilo que somos, um povo
extraordinário do ponto de vista genético com várias origens.
Sucede
que estando eu a sair de um supermercado, topo com essa pessoa amiga, paramos
claro está a conversar, tínhamo-nos encontrado numa esplanada de praia estando
eu na altura assim por dizer “descapitalizado”, essa pessoa amiga fez o favor
de me emprestar dez Euros, com a minha solene promessa de que assim que nos
encontrássemos, lhe retornaria os capitais, pagando inclusive um modesto juro
sob a forma de um café, assim foi.
Ali
à porta daquele supermercado, estávamos pois à conversa, cavaqueando sobre
aqueles temas corriqueiros de quem regressa de férias, quando me recordei dos
dez paus em dívida, peguei na carteira, arrumada que estava no bolso de trás do
calçonito, de lá rebusquei uma nota de tal valor e estava a entregar a nota a
essa pessoa amiga que tinha feito esse salvador favor de me emprestar os
cabedais necessários para o momento de aflição, quando passaram por nós das
mulheres, uma delas, olhou para o lado e atirou alto e bom som;
-
Vai para a tua terra ó preta de merda!
Olhei
de imediato, eram duas mulheres, vestidas de saia comprida, cabelos compridos
em trança, duas senhoras pertencentes a uma pretensa etnia bem conhecida, gente
que se reclama diferente, mas que afinal são mais do mesmo, iguais a muitos
outros.
O
meu espanto foi tal que demorei a reagir, mas passado o espanto inicial
interpelei a pessoa, porque raio estava a falar assim, respondeu-me aos berros,
como fazem muitas vezes, que os pretos eram isto e mais aquilo, que lhes davam
tudo, porque torna e porque deixa, tudo acompanhado por muitas poses e gestos,
como fazem os perus para parecerem maiores e mais ferozes do que na realidade
são, enfim uma espectáculo digno de dó.
Virei-lhe
as costas, vim embora, deixei a senhora a falar sozinha, tenho por princípio de
vida que não se discute com gentalha racista, estúpida e mal-educada, a esse
tipo de gente o melhor é ignorá-los, não valem o esforço, nem sequer a
tentativa de pretender ter uma conversa civilizada.
Deixo-vos
este episódio, caricato, anedótico deste Mundo completamente em perda, pensem o
que quiserem, por mim, como já disse várias vezes, este episódio de novo o
prova, a estupidez é a característica humana mais democrática que existe,
porque não escolhe raça, cor ou credo, os estúpidos, os racistas boçais existem
em todas as cores, para se poder ser considerado humano e respeitado enquanto
tal, não basta nascer humano, temos de nos comportar como humanos, de que vale
gritarmos que somos humanos quando nos comportamos pior do que qualquer besta
selvagem, para se poder invocar essa qualidade, temos de começar a sê-lo, temos
de agir com humanidade, temperança, com respeito pelo próximo, mas isso é o que
muita gente parece não perceber, não se nasce humano, aprendemos a ser humanos,
ou antes alguns aprendem, outros nunca lá chegam.
Um abraço, deste vosso amigo
Barão da Tróia
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