quinta-feira, outubro 16, 2008

Ficção Nacional

Venceslau Pintaroxo, acordou, bem disposto, o que era raro, naquela chuvosa manhã, lá fora o reboliço matinal de carros carrinhas e carretas, ensurdecia e ofuscava a manhã tímida, tomou banho vestiu-se engoliu um leite com café e saiu do quartito alugado com serventia de casa de banho, estava com saudades de casa, da mulher e dos filhos, mas que diabo nunca mais estava de folga para os poder ir ver, aguardava colocação mais próximo, daí a quanto tempo ainda não sabia, ainda ponderará mudar-se para a cidade grande, mas com o seu ordenado não dava, além disso os miúdos estavam na escola e a mulher não poderia largar assim o emprego do pé para a mão.
Chegou ao local de trabalho, distribuidas as tarefas, seguiu, a meio da manhã teve um azar e rasgou a calça de serviço, caramba teria de comprar outra do seu bolso, além disso saíra um ordem interna para mudar de camisa, teria também de comprar mais três ou quatro camisas, sempre do seu bolso, ia pensando com os seus botões, entretanto alguém o chama, o problema era complicado teria de pedir que viessem outros camaradas para ajudar, o rádio da viatura para supostamente ligar à sede, não funcionava, resultado, Venceslau teve de gastar dinheiro do seu telemóvel para ligar, era sempre a mesma coisa, diabos levassem aquele emprego.
Foi almoçar, uma sandocha mal comida e um sumo, que já tinha de ir levar uma encomenda, a meio do caminho bateu com o carro, porra, lá estava metido em sarilhos, processo disciplinar e claro pagar do seu bolso os estragos, enfim esperemos que o dia termine, amanhã é dia de folga. A tarde já vai a meio e Venceslau, apanha uma encomenda, diabo está estragada, tem de ser levada ao depósito, amanhã, tem de lá estar para apresentar a dita encomenda ao chefe e preencher a papelada toda, porra lá se vai a folga, e eu que contava ir ver a famelga, pensou Venceslau com os seus botões, lá se ia tudo por água abaixo, diabo de emprego.
Chamada de urgência, levantar encomenda, num daqueles bairros, em que até o ar é mau, má sina, ir a esses sítios era sempre uma grande tragédia, mas serviço é serviço, chegado lá, a confusão habitual, gritaria, confusão, carimbos azuis de um lado, amarelos do outro, choros ameaças, enfim o dia a dia normal, alguém ameaçara um colega, este sem poder responder levara uma pancada e fora de charola para o hospital, 10 pontos no cocuruto da tola e uns dias de baixa para descansar, rasgaram-lhe a camisa, teria de comprar outra do seu bolso, porque a empresa não dá nada a ninguém.
Fim do turno, Venceslau estava esgotado, entretanto, chega o chefe de turno, mudança de planos, era preciso ir vigiar a descarga de várias encomendas, seguiram todos, até às quatro da matina, caramba Venceslau estava de rastos, iria dormir umas 4 horitas e depois voltava tudo ao mesmo, que porra de emprego.

Isto é pura ficção, poderia ser Kafka, não pela qualidade da escrita, mais pelo absurdo das situações, mas não, também poderia ter outro título “Ser Polícia em Portugal”, mas não, este texto é pura ficção, agora imaginem-se a trabalhar em semelhantes condições, imaginem-se!

Um abraço, deste vosso amigo
Barão da Tróia

3 comentários:

Anónimo disse...

Na "estória" só faltou contar que o Venceslau ás tantas da noite se fechou na casa de banho.Os colegas que estavam de piquete ouviram um barulho ,foram a correr e deram com o triste estendido no chão e a velhinha arma que lhe estava atribuida,ainda fumegava...desta vez tinha disparado.
Bom fim de semana.

Jorge P. Guedes disse...

FICÇÃO BEM PRÓXIMA DA REALIDADE, NãO?

SE EU FOSSE POLÍCIA, ACHO QUE VIRAVA LADRÃO!

GOSTEI.

UM ABRAÇO.
Jorge P.G Sineiro

Alien David Sousa disse...

Pois é complicado imaginar-me na pele do "azarado" V. Mas sei que existem muitas pessoas pelo nosso Portugal a fora que vivem esta realidade e outras bem piores. Quando mencionas na história o facto de ter de ser ele a pagar o uniforme ou de ser ele a pagar as chamadas do seu próprio telemóvel, é uma realidade dos nossos dias que muitos enfrentam e que não podem abrir a boca se querem continuar a ter emprego. As horas tardias, tudo isso é bem real e bem actual.

Gostei bastante da tua história Barão

Saudações alienígenas & kisses